
Não tem como ser diferente, diante da caótica realidade que o Brasil vem vivenciando a mais de uma semana: o assunto da vez é a greve dos caminhoneiros, que há nove dias paralisa não só estradas e rodovias, mas a grande maioria dos serviços essenciais em todo o país. Assim, face às consequências concretas que abalam o cotidiano da sociedade de modo geral, o assunto merece também a nossa menção.
Mas, afinal, o que os manifestos do setor têm haver com meio ambiente e sustentabilidade ambiental, que são os temas centrais do nosso blog? Sob uma ótica superficial e generalista, nada. No entanto, se deixarmos os interesses políticos e os direitos de toda a classe “de lado” – este último legítimo, diga-se de passagem –, vamos chegar a alguns fatores que muito nos interessam.
De acordo com o documento oficial do chamamento de greve postado no site da Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam), o propósito principal da paralisação é tornar o óleo diesel isento de impostos. O diesel é o combustível que os caminhões e outros veículos, geralmente os classificados como “pesados”, utilizam para fins de locomoção.
Isentar os impostos referentes ao diesel significa pôr fim às alíquotas do PIS (Programa de Intervenção Social) e do Cofins (Contribuição para o Orçamento da Seguridade Social) que recaem sobre essa fonte. E o prejuízo com a falta dessas arrecadações, como lamentou em nota a Receita Federal, vai representar menos cerca de 14 bilhões de reais aos cofres públicos.
Outro ponto exigido pela categoria é a isenção da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) para o diesel comercializado dentro do território nacional, para transportadores autônomos. As negociações neste ponto estão acirradas, mas, diante da pressão dos caminhoneiros e com os danos da greve cada vez mais assombrosos, a Câmara dos Deputados já aprovou, neste domingo (27/05), uma medida que promete zerar gradualmente a cobrança do PIS/Cofins sobre o óleo diesel até o final do ano.
E é exatamente nesse ponto que as questões ambientais se encaixam. Isso porque além de ter como destino o pagamento de alguns serviços e benefícios oferecidos pelo governo, os impostos sobre os combustíveis também têm a função de proteger o meio ambiente. Isso porque são revertidos, em parte, para financiar ações que visam reduzir as emissões de poluentes oriundas do transporte de cargas.
Levando-se em conta que o meio rodoviário de transporte é responsável por 65% da circulação de toda a carga que é transportada no Brasil, segundo levantamento divulgado por pesquisadores da FGV e Ipea no início do mês, a responsabilidade do setor nas emissões de gases poluentes é igualmente representativa. E, como tal, merece atenção – e compensação!
Mais uma vez ressaltando o direito à greve dos caminhoneiros, que, por sinal, vêm conseguindo demonstrar a real força e importância que têm não só para a sobrevivência econômica do nosso “Brasilzão”, mas, também, para a existência pacífica e confortável de toda uma nação, não podemos, contudo, fechar os olhos para um perigoso reflexo que com certeza está por vir.
Quais medidas serão tomadas para compensar o “rombo” nos recursos destinados a minimizar os impactos ambientais que anteriormente mencionamos? Porque eliminar completamente as arrecadações do PIS/Cofins sobre o diesel, mais do que ser um ato de total desespero de um governo que se mostra incapaz de resolver “como gente grande” os problemas de casa, parece ser uma solução que visa tapar o sol com a peneira. E que, como trágica consequência, vai acabar por tornar ainda mais crítico o estágio de degradação ambiental ao qual estamos submetidos. E isso porque nem entramos no mérito de outras áreas que com certeza serão afetadas com essa medida, como Saúde e Educação.
Temos total consciência de que o debate envolve diversos lados e fatores e que, portanto, merecia muito mais espaço para ser discutido com profundidade, como realmente merece. Afinal, é evidente que a política desenfreada e descabida de aumento dos preços dos combustíveis – que deu origem à manifestação – incomoda. E muito. Assim como os rumos que estão sendo tomados para “resolver” os conflitos.
Mas pegando carona no cenário atual, finalizamos por aqui deixando a seguinte reflexão, ainda sob a ótica ambiental que nos toca: o Brasil está defasado em estrutura governamental e precisa urgente de uma reforma estrutural. Faz-se necessário quase que resetar e começar do zero. E nesse projeto de renovação é preciso incluir o planejamento de um futuro sustentável.
Nesse sentido, não está mais do que na hora dos nossos governantes superarem a era dos combustíveis fósseis (carvão, gás e petróleo) e, com isso, avançar na construção de matrizes energéticas a partir da articulação de fontes naturais vindas do sol, do vento e da água, que são bem menos nocivas? Esses recursos o Brasil tem de sobra, mas não está sabendo aproveitar.
Temos a segunda gasolina mais cara do mundo e uma inflação energética que está no limite. Acordar para a necessidade de investir seriamente em tecnologias que levem a um modelo energético 100% renovável se mostra, pois, o caminho mais eficiente, certo e justo para mudanças futuras. Os caminhoneiros certamente irão agradecer. O planeta, e nós, também!